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Mostrando postagens de janeiro, 2012

A vingança de Emma Zunz

Nos últimos tempos, tenho pensado muito em vingança. Não no sentido banal da palavra, mas na vingança enquanto resposta a uma injustiça. Mais ou menos como o que fez Emma Zunz, a personagem de Jorge Luis Borges no conto homônimo, incluído em O Aleph (Ed. Globo, Trad. de Flávio José Cardozo). No desejo de vingar seu pai, injustamente acusado de um desfalque no caixa da empresa em que trabalhou a vida toda, ela monta uma estratégia limite, tão terrível quanto eficaz. A vingança de Emma, que resultou em um assassinado, não a levou ao castigo. A justiça humana não tem lugar nesse conto de Borges. Pois Emma valeu-se do próprio corpo no corajoso estratagema que montou. Nem o asco de si mesma, nem a tristeza de ter chegado tão longe impediram-na de levar a cabo o planejado. Foram dois tiros a queima roupa e o culpado estava no chão. Mas ela não podia ser castigada: afinal, era um ato de vingança com fim justo. Quando a polícia chegou, acusou o morto de ter abusado dela. Antes, porém, tomou p

Thomas Bernhard, uma (re)descoberta literária

Thomas Bernhard, escritor austríaco nascido na Holanda Poucas coisas são tão encantadoras na relação do leitor com a obra literária quanto a redescoberta de um texto ou o reencontro com um autor que havia muito não o líamos. Refiro-me ao escritor austríaco Thomas Bernhard (1931-1989), que redescobri neste período em que estive em Viena. Até então, havia lido apenas, no início dos anos 1990, O sobrinho de Wittgenstein (RJ: Rocco, 1992, trad. de Ana Maria Scherer) e conhecia, de orelha, romances como Extinção , Árvores Abatidas e O Náufrago , todos já traduzidos para o português. Eis que em Viena descobri Heldenplatz , uma peça teatral que estreou no Burgteather em 1988, marcando de forma polêmica os 50 anos do Anschluss da Áustria com a Alemanha de Hitler. Heldenplatz , ou Praça dos Heróis, era o lugar que mais gostava de ir quando estava em Viena, seja para passear ou simplesmente sentar e ficar observando o movimento dos turistas e a paisagem (os monumentos, o passado, os trau

Uma lágrima para Daniel Piza

O ano de 2012 iniciou com uma notícia triste para o jornalismo brasileiro: a morte de Daniel Piza, ocorrida na sexta-feira à noite, dia 30, aos 41 anos. Não o conhecia pessoalmente; era apenas um leitor de sua coluna semanal no “Caderno 2” de O Estado de S. Paulo e acompanhava, assim como muitos leitores, sua brilhante trajetória de crítico e de escritor. Jornalista com sólida formação cultural, Daniel Piza era formado em Direito, não fez faculdade de Jornalismo e tudo indica que sua cultura era fruto muito mais do ambiente familiar e de um tenaz esforço individual do que de uma educação formal, escolar. Era capaz de escrever sobre vários assuntos, com inteligência e agilidade. O amplo espectro de seus interesses, que ia da política às artes, passando pelo futebol, e a imagem de jovem culto e extremamente produtivo eram os traços marcantes de sua persona pública. Praticou, como poucos, o jornalismo de ideias, combinando erudição com divulgação, sem vulgarização. Nem sempre concordava