domingo, 27 de setembro de 2009

Apresentação de Edward Said


Uma apresentação das ideias e da trajetória de Edward Said (1935-2003) implica, necessariamente, fazer referência às suas origens. Isto por que suas raízes o situam na encruzilhada dos problemas atuais entre Oriente e Ocidente e no coração dos conflitos do Oriente Médio. Said nasceu em Jerusalém, mas não é judeu, é palestino de origem, mas sua família professava a fé cristã. A etnia árabe não o transformou em muçulmano. A isso tudo, some-se uma formação que teve início no Cairo e se prolongou por Nova York, onde Said acabou se fixando em definitivo ao se tornar professor na Universidade de Columbia.

Intelectual humanista, sua trajetória foi marcada por uma posição de crítica tanto em relação ao establishment político e cultural do Ocidente, quanto em relação ao mundo árabe. Autor de dezenas de livros abordando sempre as relações entre cultura e política, tornou-se mundialmente conhecido a partir da publicação de Orientalismo, em 1978. Nesta obra, procurou desconstruir as concepções dualistas, que dividem o planeta de modo estanque em Oriente e Ocidente.

Para Said, o orientalismo é um estilo de pensamento: “um modo de pensar o Oriente que ajudou a subordiná-lo através do conhecimento enviesado produzido sobre ele e que deu ao Ocidente o poder de ditar o que era significativo sobre o ‘outro’, classificá-lo junto com outros de sua espécie e colocá-lo ‘no seu lugar’.

Nos anos 1990, a tese desenvolvida em Orientalismo foi expandida para o cenário dos ex-impérios coloniais da Inglaterra, França e Estados Unidos, resultando no magnífico estudo Cultura e imperialismo (1993), que trata da relação entre cultura e império no contexto da descolonização.

A estas duas obras, que podem e devem ser lidas em conjunto, vem somar-se Covering Islam, de 1997, que estuda a cobertura dada pela mídia para os conflitos envolvendo países que, de uma forma ou de outra, pertencem ao chamado círculo do islamismo. O objetivo aqui é formular uma crítica aos critérios de noticiabilidade que norteiam a cobertura jornalística de conflitos que ocorrem em países como Irã, Iraque e Afeganistão, assim como o próprio conflito árabe-israelense. “Como a mídia ocidental determina o modo como nós vemos o resto do mundo?”, perguntas Said. A resposta passa pela apresentação de narrativas alternativas à visão hegemônica e pela construção de novas perspectivas da história.

Contra as concepções essencialistas de mundo, Said recomenda uma tomada de consciência sobre o lugar ocupado por aquele que tem a posse do discurso. Ecoando Foucault, Said sustenta que toda fala tem um lugar. E todo conhecimento ocupa um lugar de poder.
M.S.V.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

A história de um derrotado

Desonra, de J.M. Coetzee, foi finalmente adaptado para o cinema. Desde o seu lançamento, em 1999, muitos diretores tentaram comprar os direitos deste romance do escritor sul-africano. Coetzee somente autorizou a adaptação recentemente, e coube aos também sul-africanos Steve Jacobs e Anna Monticelli o desafio de transpor para as telas esta inquietante e devastadora história, que se passa na África do Sul pós-apartheid.

Em Desonra, o ressentimento, os ódios de classe e o conformismo são as forças que ocasionam os conflitos entre personagens que habitam uma sociedade dilacerada. O apartheid acabou; ficou a terra devastada por conflitos não resolvidos.

John Malkovich interpreta David Lurie, um professor de literatura que, aos 52 anos, tornou-se um derrotado. Leva uma vida sem sobressaltos, burocrática, conformada. Pragmático, ele resolve sua solidão recorrendo a uma prostituta, a quem visita regularmente uma vez por semana.

Sua rotina desmorona depois que ele se envolve com uma de suas alunas. Perde o cargo de professor e abandona o ambiente politicamente correto da universidade para se refugiar no interior do país, na fazenda onde mora sua filha.

Li esse romance há alguns anos, de um fôlego só, sem anotar uma única palavra, nenhum mesmo um traço nas margens do livro.

A leitura de Desonra incomoda, mas é impossível largar o livro. Coetzee sabe prender o leitor com sua prosa límpida, suas palavras medidas e imagens devastadoras.
Agora o drama do professor arruinado está nas telas. Não vejo a hora de conferir.
M.S.V.

  O Martelo, de Manuel Bandeira . As rodas rangem na curva dos trilhos Inexoravelmente. Mas eu salvei do meu naufrágio Os elementos mais cot...