De uma velha anotação, datada de meados de 1985: “a linguagem é uma pele: esfrego minha linguagem no outro. É como se eu tivesse palavras ao invés de dedos, ou dedos na ponta das palavras”. As palavras roçam a superfície das coisas. E não conseguimos sair da linguagem, do mesmo modo que não é possível sar de nossa pele.
Produzir um discurso “que não se enuncie em nome da Lei e/ou da Violência: cuja instância não seja nem política, nem religiosa, nem científica; que seja, de certa forma, o resto e o suplemento de todos esses enunciados. Como chamaríamos esse discurso? erótico, sem dúvida, pois ele tem a ver com o gozo”. (Roland Barthes por Roland Barthes, p.91)
Aforismo de domínio público: “Não é preciso ter esperança para empreender, nem ter sucesso para perseverar.”
Como se fosse dito por uma personagem de romance: “seu desejo sempre foi produzir uma obra que estivesse desvinculada da universidade. Desconfia do didatismo, do ensino da literatura, da grade curicular, dos autores bons para ensinar... Vastas emoções, pensamentos bons para falar, não para escrever”.
Digressão, exagero e malícia são três registros discursivos marcados pela marginalidade em relação à retórica, são os delinquentes da linguagem discursiva.
M.S.V.
domingo, 29 de agosto de 2010
domingo, 15 de agosto de 2010
Bienal maltrata o grande público
Frequento a Bienal do Livro há pelo menos uns vinte anos e venho observando que, desde as últimas cinco edições, os organizadores do evento empenham-se em atrair cada vez mais o grande público. Sendo assim, causa surpresa constatar a falta de infra-estrutura da Bienal para receber e tratar com um pouco de respeito as massas que acorrem ao Pavilhão do Anhembi, principalmente nos finais de semana.
Essa falta de estrutura começa no transporte gratuito que liga o metrô ao local do evento. Ontem, sábado, havia filas gigantescas para chegar até o local dos ônibus. Era necessário esperar pelo menos 40 minutos para entrar no veículo. Era visível a falta de estrutura do local, o entorno do Terminal Rodoviário Tietê, para aglutinar tanta gente. Pais com crianças, idosos e pessoas de todas as idades - e classes sociais - espremiam-se para organizar a fila que os levaria ao ônibus gratuito (provável razão do descaso). Tudo isso sem a presença de qualquer fiscal do evento. Somente próximo ao ônibus é que havia uma pessoa organizando a entrada. Até então, tudo era uma desordem, com várias pessoas furando fila para levar vantagem. Isso sem falar nos usuários tradicionais do terminal, que em seu entorno possui pontos finais de várias linhas urbanas e intermunicipais.
Mas a falta de estrutura não parava por aí: no interior do pavilhão havia novas e longas filas não só para ir aos banheiros, como era de se esperar (afinal, eram gratuitos), mas até mesmo para pedir um simples café com pão de queijo era preciso esperar 20 minutos numa fila. Os quiosques não davam conta, não havia bancos livres para sentar e em determinados locais simplesmente era impossível transitar. Não vou falar aqui da irrelevância nem da mediocridade de muitos e muitos estandes presentes por lá. Afinal, trata-se de um evento popular.
É evidente que não se pode ser contra o grande público, principalmente numa iniciativa como essa, em que o personagem principal é o livro. Mas espanta, e muito, constatar que a CBL – Câmara Brasileira do Livro – ainda não tenha adquirido expertise no trato com o grande público. E o preço do ingresso (R$ 10,00) não é nada desprezível para um evento popular . Nunca vi tanto descaso com o público como neste ano. Quem vai uma vez, não volta mais, e isso é muito ruim, pois um evento dessas proporções pede uma segunda visita. Será?
M.S.V.
Essa falta de estrutura começa no transporte gratuito que liga o metrô ao local do evento. Ontem, sábado, havia filas gigantescas para chegar até o local dos ônibus. Era necessário esperar pelo menos 40 minutos para entrar no veículo. Era visível a falta de estrutura do local, o entorno do Terminal Rodoviário Tietê, para aglutinar tanta gente. Pais com crianças, idosos e pessoas de todas as idades - e classes sociais - espremiam-se para organizar a fila que os levaria ao ônibus gratuito (provável razão do descaso). Tudo isso sem a presença de qualquer fiscal do evento. Somente próximo ao ônibus é que havia uma pessoa organizando a entrada. Até então, tudo era uma desordem, com várias pessoas furando fila para levar vantagem. Isso sem falar nos usuários tradicionais do terminal, que em seu entorno possui pontos finais de várias linhas urbanas e intermunicipais.
Mas a falta de estrutura não parava por aí: no interior do pavilhão havia novas e longas filas não só para ir aos banheiros, como era de se esperar (afinal, eram gratuitos), mas até mesmo para pedir um simples café com pão de queijo era preciso esperar 20 minutos numa fila. Os quiosques não davam conta, não havia bancos livres para sentar e em determinados locais simplesmente era impossível transitar. Não vou falar aqui da irrelevância nem da mediocridade de muitos e muitos estandes presentes por lá. Afinal, trata-se de um evento popular.
É evidente que não se pode ser contra o grande público, principalmente numa iniciativa como essa, em que o personagem principal é o livro. Mas espanta, e muito, constatar que a CBL – Câmara Brasileira do Livro – ainda não tenha adquirido expertise no trato com o grande público. E o preço do ingresso (R$ 10,00) não é nada desprezível para um evento popular . Nunca vi tanto descaso com o público como neste ano. Quem vai uma vez, não volta mais, e isso é muito ruim, pois um evento dessas proporções pede uma segunda visita. Será?
M.S.V.
domingo, 8 de agosto de 2010
O velho livro e os novos suportes

A Flip terminou hoje e já na próxima sexta-feira inicia a 21ª edição da Bienal Internacional do Livro de São Paulo. Impossível não deixar de observar que o livro e a literatura estão no centro das atenções neste mês de agosto. Ao mesmo tempo, inspiram reflexões sobre o futuro desse velho suporte.
Em Paraty, por exemplo, o historiador norte-americano Robert Darnton (foto) destacou a fragilidade das mídias digitais, que não resistem ao tempo em função das constantes mudanças tecnológicas, como os velhos disquetes, que só podem ser abertos por computadores antigos. Enquanto isso, os impressos permanecem vivos por séculos.
Li certa vez numa entrevista o escritor italiano Umberto Eco comparar o livro impresso àquelas invenções básicas da humanidade, como os talheres, por exemplo. Assim como o livro, será difícil encontrar um substiututo para o garfo, a colher ou a faca. O livro é mesmo um dispositivo maravilhoso e quem aposta na sua morte terá que esperar muito tempo ainda.
Em Não contem com o fim do livro, de Umberto Eco e Jean-Claude Carriere (Record, 2010), o autor de O nome da Rosa expressa sua preocupação diante da rapidez com que os novos suportes são deixados para trás. Diante dos modernos instrumentos de leitura, que se tornam obsoletos muito rapidamente, o livro dá provas de sua incrivel capacidade de resistir ao tempo.
“Ainda somos capazes de ler um texto impresso há cinco séculos. Mas somos incapazes de ler, não podemos mais ver, um cassete eletrônico ou um CD-ROM com apenas poucos anos de idade. A menos que guardemos nossos velhos computadores em nossos porões”, escreve Eco. Nem fim do livro, nem fim do leitor. Vamos à Bienal!
M.S.V.
domingo, 1 de agosto de 2010
Humanismo, linguagem e revelação

Ainda não comentei aqui o surgimento, em março último, do Sabático, suplemento de O Estado de S. Paulo dedicado à literatura e à cobertura de livros em geral. Circula aos sábados e promete tornar-se um dos melhores cadernos de jornalismo cultural da atualidade. Sugere também que nem tudo está perdido quando o assunto é indústria cultural ou cobertura de livros.
Além de reportagens, entrevistas, ensaios e seção de notas curtas sobre o mercado editorial, o Sabático tem duas colunas fixas dedicadas à crítica. Uma delas chama-se Prosa de Sábado, em que se alternam dois críticos de linhagens distintas: Silviano Santiado (foto), ligado à universidade, e Sérgio Augusto, crítico de jornal. Ambos são expoentes em suas áreas de atuação e, apesar de falarem de lugares opostos, a midia e a academia, suas colunas se aproximam em pelo menos um aspecto: a linguagem.
Tanto um quanto outro escrevem em tom coloquial, mais próximo da crônica do que do artigo. Será necessário uma análise mais detida de suas colunas para delimitar a proximidade ou não em aspectos como temas abordados, uso de jargão, diálogo com o leitor, obras e autores escolhidos, etc. Mas os dois podem ser classificados como críticos-cronistas. Com isso, quero dizer que ambos escrevem para um público geral, para os leitores e não para os especialistas.
Arrisco-me a dizer que o estilo de Silviano Santiago, que fez sua carreira de crítico na universidade, manteve-se a salvo do hermetismo que tem marcado a crítica acadêmica desde a década de 1970. Se pararmos para pensar, nem ele nem Antonio Candido, outro crítico-professor eminente, tiveram suas obras contagiadas pela linguagem hermética que se destina ao público especializado e não ao público amplo. Suas carreiras não anteriores às imposições da bibliometria.
A questão que tanto me preocupa – a linguagem da crítica -- coincide com a análise de Edward Said em Humanismo e crítica democrática. Para ele, existe uma escrita adequada e uma ecrita não adequada. Nas humanidades, é preciso evitar a todo custo o uso do jargão especializado, sob o risco de excluir do debate ou mesmo do acesso ao conhecimento camadas consideráveis de leitores. Escreve Said:
“O humanismo deve ser uma forma de revelação, e não de segredo ou de iluminação religiosa. A especialização como um instrumento de distanciamento saiu do controle, principalmente em algumas formas acadêmicas de expressão, na medida em que se tornaram antidemocráticas e até intiintelectuais.” (Said, E. Humanismo e crítica democrática, p.97, Companhia das Letras, 2007, trad. Rosaura Eichenberg)
Hoje como nunca, especialização e humanismo precisam caminhar juntos. O crítico não pode esquecer de seu papel de mediador, de hospedeiro, e este é um papel público. O caderno Sabático surge com esta vocação.
M.S.V.
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