domingo, 24 de junho de 2012

“Tigres no espelho”: ensaios de George Steiner


George Steiner

Tem livro novo de George Steiner nas livrarias. “Tigres no espelho e outros textos da The New Yorker” (Globo Livros, R$ 55) reúne 28 ensaios publicados originalmente na conceituada revista norte-americana. Durante muitos anos seus ensaios foram minha leitura constante. Agora temos nova oportunidade de conhecer sua prosa cheia de inteligência e verve, que honra o leitor, numa época em que “até mesmo as pessoas instruídas têm apenas tintura de conhecimento clássico ou teológico”. Sim, Steiner tem familiaridade com diferentes culturas e está em casa quando falar de literaturas e autores os mais diversos, e em diferentes idiomas.
George Steiner nasceu em Paris, em 1929, mas foi educado na Inglaterra e nos Estados Unidos. Sua formação é incomum, rara para os dias de hoje: foi alfabetizado em francês, inglês e alemão. Li certa vez uma entrevista dele na Magazine Litteraire, em que ele lembra como foram fundamentais para sua formação as sessões semanais de leitura de Shakespeare, com uma professora escocesa contratada pelo pai, ou as aulas de latim e grego que freqüentou ainda jovem. Seus ensaios refletem toda essa formação e as leituras que faz da obra literária só ganham com esse refinamento. E o principal nos dias de hoje: ele escreve com legibilidade, clareza e sem dar concessões ao gosto médio.
No artigo que dá título ao livro, Steiner analisa a obra do escritor argentino Jorge Luis Borges. No trecho a seguir, ele fala sobre a relação de Borges com a tradição literária, que foi a substância de sua obra: “Borges é um curador, um tesoureiro de ninharias despercebidas, um indexador das antigas verdades e perdidas conjecturas que se amontoam no sótão da história”. Um diagnóstico certeiro sobre o autor de O Aleph.
George Steiner é um dos melhores ensaístas surgidos no século 20 e conseguiu construir uma obra de crítica (cultural e literária) sem sucumbir às contingências da escrita acadêmica. Seus textos são límpidos e repletos de erudição. É leitura obrigatória para os dias de hoje.
M.S.V.

sábado, 9 de junho de 2012

A história de uma família numa coleção de netsuquês


O Palácio Ephrussi, na Ringstrasse, em Viena


Transformar em livro a história de uma família é uma idéia cujos resultados costumam chatear o leitor, que em geral se vê diante de páginas que desfilam elogios e que só constróem imagens oficiais dos biografados. Não é o que ocorre com A lebre com olhos de âmbar, de Edmund de Waal (Ed. Intrínseca), que, conta a história de uma coleção de miniaturas feitas de marfim e madeira que pertenceu aos Ephrussis, uma família originária de Odessa, na Rússia, que se estabeleceu na França e na Áustria no final do século 19.
Os Ephrussis eram de origem judaica e fizeram fortuna no setor financeiro, ao mesmo tempo em que revelaram-se grandes colecionadores de obras de arte. Ao herdar a coleção de miniaturas, o autor, Edmund de Waal (desconhecido por aqui, mas parece que e reconhecido lá fora como ceramista) decide mergulhar na história para resgatar a trajetória de seus avós.
Parte para Paris e Viena em busca de documentos de seus antepassados e reconstitui a trajetória de uma família que presenciou fatos históricos dos mais dramáticos dos séculos 19 e 20, como o colapso do Império Austro-Húngaro, a crise austríaca das primeiras décadas do século e a anexação da Áustria pelo Nazismo, com o consequente confisco de suas propriedades.
O fio narrativo do livro é essa coleção de 264 miniaturas, que o autor herda de seu tio-avô, e que são chamados de netsuquês. Como explica Sérgio Telles em sua coluna de hoje em OESP, eram usados pelos japoneses para prender uma pequena bolsa na faixa do quimono. Portanto, um item chique da indumentária nipônica.
Mas é nos momentos em que fala do ramo austríaco de seus antepassados que o livro de Edmund de Waal me interessa. Em Viena, os Ephrussis moravam num belíssimo palácio feito de mármore, localizado na Ringstrasse, em frente à Universidade de Viena e quase ao lado da Votivkirche, que hoje passa por restauro de sua fachada. As descrições da cidade, dos hábitos da família, as leituras dos filhos, do contato natural com a arte que só se adquire em família... Enfim, uma atmosfera que encanta o leitor, construída numa escrita singela e cativante. Um livro que surpreende. M.S.V.

  O Martelo, de Manuel Bandeira . As rodas rangem na curva dos trilhos Inexoravelmente. Mas eu salvei do meu naufrágio Os elementos mais cot...