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Franzen, capa da Time |
Nesta quarta-feira
começa a décima edição da Flip, a Festa Literária de Paraty. Embora o escritor
homenageado seja o nosso maior poeta, Carlos Drummond de Andrade, boa parte das
atenções devem se dirigir para a presença de três dos mais importantes
escritores em atividade hoje. Estarão presentes em Paraty o norte-americano
Jonathan Franzen, o inglês Ian McEwan e o espanhol (na verdade, catalão)
Enrique Vila-Matas. Três vozes bem distintas uma da outra, mas extremamente
significativas da literatura praticada neste século XXI.
Percorro livrarias em
São Paulo e vejo que os livros de Franzen inundam as prateleiras. Até uma
coletânea de artigos dele (“Como ficar sozinho?”) foi traduzida. Franzen já
está no Brasil e, pelo que leio, deseja conhecer um pouco do país após seus
compromissos na Flip. Quer visitar a Bahia e o Pantanal, onde pretende fotografar
pássaros, seu hobby favorito.
Aproveito o fait-divers em torno de Franzen e retomo
a leitura interrompida de Liberdade,
romance lançado no final do ano passado e que chegou aclamado como o “livro do
ano e do século”. Não é nada disso. Já li resenhas comparando Liberdade a Guerra e Paz, de Tolstoi. Um enorme exagero, talvez motivado pelo
fato de que Patty, a protagonista, aparece lendo o romance de Tolstoi... Isso
não basta. Aliás, há muita estratégia de marketing na visibilidade de Franzen.
A narrativa de Liberdade é longa
demais, há digressões demais.
Para viver de sua
atividade, um escritor precisa de mercado. Romances longos, como este, que tem
600 páginas, são bons para o mercado editorial, pois o preço de capa é maior,
assim como os lucros do autor, que precisa viver disso. Considerando que um
escritor de qualidade (como é o caso de Franzen) compete com inimigos poderosos,
como a indústria do audiovisual, a internet e com o colapso do hábito de
leitura, nada mais justo que ele se preocupe com a economia de seu trabalho. Um
livro de 100 páginas gera lucros ínfimos para todo o circuito de produção
editorial.
Mas do ponto de vista
exclusivamente narrativo, me parece inegável que Liberdade poderia ter a metade do seu tamanho. Uma crítica
efetivamente isenta de uma obra precisa separar todo esse aparato mercadológico
que circunscreve o lançamento de um produto no mercado da obra em si. Tinha
razão Pierre Bourdieu quando escreveu que a indústria de bens simbólicos
procura sempre esconder a economia que faz o circuito funcionar.
Em Liberdade, Franzen tenta retomar a velha tradição do romance
social, bem ao gosto do leitor do século 19 e 20, antes que as vanguardas
operassem a viravolta narrativa. O cenário do livro é o Meio Oeste dos EUA,
onde se passam histórias familiares contemporâneas recheadas de relacionamentos
confusos, sentimentos difusos, amizade, paixão, traição... Como numa série de
TV.
Mas uma coisa não se pode
negar: ele escreve muito bem. O livro tem estilo ágil, vocabulário moderno,
linguagem despojada, temas do dia-a-dia, como ambientalismo, antidepressivos,
crise financeira. Leio 30 páginas de uma só vez. Desta proeza somente são
capazes os grandes narradores. Penso em Stendhal, e na Cartucha de Parma, cuja leitura alterno com o romance de Franzen.
M.S.V.