Os poucos e exigentes leitores deste blog me perguntam por que tenho
postado com menos freqüência nos últimos meses. Respondo com uma palavra: é a
vida de professor universitário, que, com suas demandas tantas, quase não deixa
tempo para a prática de uma escrita livre, dirigida ao público amplo, e não aos
pares, como ocorre na vida acadêmica atual. Pois são tantas as atividades e
incumbências que um professor de universidade pública brasileiro precisa
cumprir atualmente que tudo deve ser direcionado ao campo acadêmico. Tudo
precisa resultar numa entrada no Lattes, sob o risco de nada “render”. Vejo-me
hoje transformado num escrevente acadêmico, imerso num laborioso e angustiante
trabalho de Sísifo. “Onde se escondeu o projeto de uma carreira autoral?”, pergunto-me.
Releio o ensaio “escritores e escreventes”, de Roland Barthes, incluído
na coletânea Crítica e verdade (Ed.
Perspectiva). O texto é da década de 1950, mas parece ter sido escrito ontem,
pois ajuda, e muito, a pensar sobre as políticas implícitas no ato da escrita.
Sua definição de escrevente, em oposição ao conceito de escritor, é lúcida e
precisa.
“Os escreventes são homens transitivos: eles colocam um fim (testemunhar,
explicar, ensinar) para o qual a palavra é apenas um meio; para eles, a palavra
suporta um fazer, ela não o constitui. Eis, pois, a linguagem reduzida à
natureza de um instrumento de comunicação, de um veículo do ‘pensamento’. Mesmo
se o escrevente concede alguma atenção à escritura, esse cuidado nunca é
ontológico: não é preocupação”, escreve Barthes. Para o escrevente, o ato da
escrita não é intransitivo. Sua escritura está sujeita a demandas, vindas do
mercado, da academia, das instituições. Voltarei ao assunto.
M.S.V.