domingo, 4 de novembro de 2012

Da memória de um leitor


Três romances me marcaram desde sempre: O Continente, de Érico Veríssimo, Ninguém escreve ao coronel, de Gabriel García Márquez e Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust. Essas histórias remetem a três dimensões de minha formação: o primeiro fala das origens, em uma região específica do Brasil, e que sempre precisam ser superadas; o segundo expõe a contingência e as implicações de ser latino-americano. E o terceiro remete à tradição ocidental, da qual somos ramos tardios.
Esses três romances ajudaram-me e ainda me ajudam a entender quem sou e o que estou sendo. Compartilho, a seguir, as inesquecíveis primeiras linhas desses três romances. (M.S.V.)

“Era uma noite fria de lua cheia. As estrelas cintilavam sobre a cidade de Santa Fé, que de tão quieta e deserta parecia um cemitério abandonado. Era tanto o silêncio e tão leve o ar, que se alguém aguçasse o ouvido talvez pudesse até escutar o sereno da solidão”. (O Continente 1, de Erico Veríssimo)

“O Coronel destampou a lata do café e notou que apenas restava uma colherinha de pó. Tirou a panela do fogo, jogou no chão de barro batido a metade da água e raspou de faca todo o interior da vasilha, até botar na panela o que restava, uma mistura de raspas com ferrugem. Sentado junto ao fogão, em atitude de confiada e inocente expectativa enquanto o café não fervia, o Coronel como que sentiu brotar de suas tripas cogumelos e lírios malignos. Era outubro. Eis uma manhã difícil de vencer, esta, mesmo para um homem de sua fibra, sobrevivente de tantas outras manhãs. Havia cinqüenta e seis anos – desde que acabara a última guerra civil – que ele não fazia outra coisa senão esperar. Outubro era uma dessas raras coisas que chegavam”. (Ninguém escreve ao coronel, de Gabriel García Márquez).

“Durante muito tempo, costumava deitar-me cedo. Às vezes, mal apagava a vela, meus olhos se fechavam tão depressa que eu nem tinha tempo de pensar: ‘Adormeço’. E, meia hora depois, despertava-me a idéia de que já era tempo de procurar dormir; queria largar o volume que imaginava ter ainda nas mãos e soprar a vela”.(Em busca do tempo perdido, Vol. 1 - No caminho de Swann, de Marcel Proust).

  O Martelo, de Manuel Bandeira . As rodas rangem na curva dos trilhos Inexoravelmente. Mas eu salvei do meu naufrágio Os elementos mais cot...