Austerlitz, de W.G. Sebald, é construído a partir de um duplo movimento: temos um narrador que conta seus encontros com Austerlitz e, a este relato, feito de lembranças, justapõe-se as recordações do próprio Austerlitz, professor aposentado, especialista em arquitetura do capitalismo, que, por sua vez, conta para o primeiro narrador histórias de suas viagens, descobertas, observações relativas aos mais variados assuntos, como um ornitólogo, um aviador, sua infância etc.
A narrativa flui, assim, em camadas de recordações, que tanto podem ser reflexões sobre sua própria trajetória, seus projetos passados e seus sentimentos presentes, como o momento em que reflete sobre o ato de ler:
“Como eu gostava, disse Austerlitz, de me sentar na companhia de um livro até noite fechada, até que não conseguisse mais decifrar uma palavra e os meus pensamentos começassem a girar em círculos, e como eu me sentia seguro sentado à escrivaninha de casa na noite escura, apenas observando a ponta do lápis à luz da lâmpada seguir como se por desígnio próprio e com absoluta fidelidade a sua própria sombra, que deslizava regularmente da esquerda para a direita e linha após linha sobre o papel pautado”. (p.123)
Uma das paixões de Austerlitz é a fotografia. Gostava de distribuir suas pequenas e gastas fotos sobre uma mesa grande laqueada de cinza-fosco, na ante-sala de sua casa em Londres. Ali sentava e ficava acionando a memória, “dispondo aquelas fotografias ou outras de sua coleção com a parte de trás voltada para cima, como se fosse uma partida de paciência, e que então, sempre admirado com o que via, ele as virava uma a uma, empurrava-as de lá para cá e uma sobre as outras, arrumava-as em uma ordem que resultava de um certo ar de família, ou ainda as retirava do jogo até que nada mais restasse senão o tampo cinza da mesa, ou até que ele, exausto de tanto pensar e recordar, era obrigado a deitar-se na otomana”. (p.120-121)
O livro, aliás, é ilustrado com uma série de fotos que parecem ter saído da coleção particular de Sebald.
M.S.V.
A narrativa flui, assim, em camadas de recordações, que tanto podem ser reflexões sobre sua própria trajetória, seus projetos passados e seus sentimentos presentes, como o momento em que reflete sobre o ato de ler:
“Como eu gostava, disse Austerlitz, de me sentar na companhia de um livro até noite fechada, até que não conseguisse mais decifrar uma palavra e os meus pensamentos começassem a girar em círculos, e como eu me sentia seguro sentado à escrivaninha de casa na noite escura, apenas observando a ponta do lápis à luz da lâmpada seguir como se por desígnio próprio e com absoluta fidelidade a sua própria sombra, que deslizava regularmente da esquerda para a direita e linha após linha sobre o papel pautado”. (p.123)
Uma das paixões de Austerlitz é a fotografia. Gostava de distribuir suas pequenas e gastas fotos sobre uma mesa grande laqueada de cinza-fosco, na ante-sala de sua casa em Londres. Ali sentava e ficava acionando a memória, “dispondo aquelas fotografias ou outras de sua coleção com a parte de trás voltada para cima, como se fosse uma partida de paciência, e que então, sempre admirado com o que via, ele as virava uma a uma, empurrava-as de lá para cá e uma sobre as outras, arrumava-as em uma ordem que resultava de um certo ar de família, ou ainda as retirava do jogo até que nada mais restasse senão o tampo cinza da mesa, ou até que ele, exausto de tanto pensar e recordar, era obrigado a deitar-se na otomana”. (p.120-121)
O livro, aliás, é ilustrado com uma série de fotos que parecem ter saído da coleção particular de Sebald.
M.S.V.
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