Talvez uma das melhores partes de Modernidade periférica, de Beatriz Sarlo, seja o capítulo 4, Vanguarda e utopia, pois é nele que a autora reconstitui, com rigor e beleza, um dos momentos cruciais da modernidade argentina: o espírito de renovação trazido por revistas como Prisma, Proa e Martín Fierro.
Esta revista, aliás, tornou-se sinônimo de uma época de efervescência literária na Argentina e, mais do que isso, delineou os rumos da vanguarda na capital do país, consolidando o processo de autonomização do campo cultural ao promover um reposicionamento dos agentes e das ideias em voga. Tanto no aspecto ideológico quanto no estético, a geração de ecritores como Hidalgo, Macedonio e Borges, descobre e divulga novos princípios de valor literário, principalmente no que tange à questão da identidade cultural, cristalizado naquilo que Sarlo denomina de “criollismo urbano de vanguarda”.
Borges discutia nas páginas de Martín Fierro “o criollismo aceitável e o inaceitável”, e de que modo “um deles, voltado à cor local, é tributário do passado, enquanto outro, ao rechaçar as marcas conhecidas do localismo, é uma invenção formal-estética portadora do novo”.
Sarlo reconstitui as transformações urbanas vividas por Buenos Aires nos agitados anos 20 e 30 do século passado. Ao fazê-lo, recorre a protagonistas situados em posições distintas do campo da produção cultural e literária. Deste modo, são contrapostos escritores consagrados, como Borges e Güiraldes, a menos conhecidos, como Castelnuovo e Olivares, e a trajetória política das vanguardas “desejosas de enfrentar o establishment literário e impor a arte pela arte”, é estudada em contraponto à postura de intelectuais de esquerda, movidos pelos ventos revolucionários do início do século XX.
M.S.V.
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