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A caminho de Viena: primeiras impressões

 
Viena, 28/10/2011, 11h a.m. Cheguei, enfim. Depois de ter ficado atordoado com as dimensões e a complexidade de um Aeroporto como o Charles De Gaule, em Paris, onde permaneci por algumas horas, segui para Viena. Quando sobrevoei Paris, que já foi a capital do século XIX, mas que continua sendo uma capital da cultura, e avistei o Sena se contorcendo lá embaixo, desejei que o avião retornasse. Mas como? Há pelo menos dez anos que você sonha com Viena. E agora, que está há apenas duas horas do seu destino, deseja mudar os planos?

Recostei a cabeça na poltrona e deixei que a imagem dos Alpes (onde está localizada a Áustria) colocasse lentamente as coisas no lugar. Paris é realmente um fascínio, mas terá que esperar. Meu destino agora é a Europa Central, mais precisamente a capital do poderoso império austro-húngaro, que deixou de existir a partir do final da Primeira Guerra (1914-18), tema, aliás, de um dos livros do jornalista e ensaísta Otto Maria Karpfen (1900-1978), o autor cuja obra estudo há muitos anos e motivo principal desta viagem até Viena.

Nem o céu carregado de nuvens, nem o frio gélido dos Alpes foram capazes de diminuir meu deslumbramento quando entrei no centro de Viena, o chamado Innere Stadt. O motorista do taxi, Carlos, um espanhol que reside há onze anos em Viena – mas que conserva intacto o sotaque de seu país de orígem – estranhou que eu já conhecesse o nome de inúmeras ruas do Centro, já que era a primeira vez que estava em Viena. “Google Maps”, expliquei, com um sorriso de brasileiro.

Já era início de noite em Viena e as luzes, o trânsito lento dos carros, dos ônibus (elétricos e bondes, todos de cor vermelha) e das pessoas em suas pesadas roupas, desencadearam em mim um absoluto encantamento. Por todas as ruas que passava, a paisagem arquitetônica se repetia: prédios monumentais, construções de duzentos anos ou até mais, absolutamente conservados e adaptados à vida moderna. Janelas e portas enormes hermeticamente fechadas, para impedir a entrada do frio. Não há nada parecido com isso no Brasil e essa primeira imagem de Viena ficará para sempre em minha memória, como um cartão postal de alumbramentos, colecionado por um brasileiro em sua primeira viagem à Europa.
M.S.V.

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