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Vestígios de leitura

De uma velha anotação, datada de meados de 1985: “a linguagem é uma pele: esfrego minha linguagem no outro. É como se eu tivesse palavras ao invés de dedos, ou dedos na ponta das palavras”. As palavras roçam a superfície das coisas. E não conseguimos sair da linguagem, do mesmo modo que não é possível sar de nossa pele.

Produzir um discurso “que não se enuncie em nome da Lei e/ou da Violência: cuja instância não seja nem política, nem religiosa, nem científica; que seja, de certa forma, o resto e o suplemento de todos esses enunciados. Como chamaríamos esse discurso? erótico, sem dúvida, pois ele tem a ver com o gozo”. (Roland Barthes por Roland Barthes, p.91)

Aforismo de domínio público: “Não é preciso ter esperança para empreender, nem ter sucesso para perseverar.”

Como se fosse dito por uma personagem de romance: “seu desejo sempre foi produzir uma obra que estivesse desvinculada da universidade. Desconfia do didatismo, do ensino da literatura, da grade curicular, dos autores bons para ensinar... Vastas emoções, pensamentos bons para falar, não para escrever”.

Digressão, exagero e malícia são três registros discursivos marcados pela marginalidade em relação à retórica, são os delinquentes da linguagem discursiva.
M.S.V.

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